sexta-feira, 28 de outubro de 2022

A quem se destina a ereção de um imbrochável?

Eis que, em plena comemoração cívico-fálico-militar do 7 de setembro último, na capital desta república brasilis, em que se comemorava o bicentenário do grito da independência proferido pelo representante da realeza da qual dependíamos, no contexto, repito, de tal comemoração, um coro de [supostos] imbrocháveis é engrossado pelo [suposto] imbrochável-mor, e todos, efusivamente, em compartilhamento viril, entoam “imbrochável!” / “imbrochável!” / “imbrochável!". 

O Dr. Sigmund Freud aludiu, em seus escritos, a algumas vias de emergência de pulsões inconscientes no âmbito da consciência, como seria o caso dos sonhos, dos chamados atos falhos, e do chiste (como foi traduzido o termo alemão para o espanhol e para o português). O chiste, que podemos tratar aqui, mais coloquialmente, como a piada, o duplo sentido, a metáfora e a ironia, são indubitavelmente atravessados por energia psíquica visível na risada, e mesmo na gargalhada que frequentemente desencadeiam. O chiste seria portador, segundo Freud, de impulsos profundos e de sentido para aquém do valor de face. 

E aí o que presenciei pela TV, no episódio a que me referi acima, me fez lembrar uma piada de gosto duvidoso, mas que me pareceu abrir caminho para um melhor entendimento do coro entoado na festa cívica. Eis a piada: um cara, do tipo ex-imbrochável, descobre a ajuda farmacológica azul do Viagra, e eis que se lhe advém uma daquelas ereções dignas dos atores de filmes pornô; a pessoa com quem convivia, diante daquele evento erétil tão especial, se anima e pergunta ao cara protagonista se seria o caso de, imediatamente, tirar proveito... Eis então que o cara-protagonista responde prontamente que NÃO, de jeito nenhum - ele, ao invés disso, iria para a birosca da esquina, exibir orgulhosamente sua ereção para os parças! 

Isso nos remete à pergunta que abre essa tosca reflexão antropológico-psicanalítica. A imbrochabilidade aparece, na cena aludida, como um adereço de “viris” para “viris”, em última análise um “affaire d’hommes”, cujos destinatários são os parças, e não uma outra pessoa investida de afeto e/ou tesão real. A ênfase instrumental na ereção do/pelo imbrochável alude, tragicamente, a uma fixação fálico-narcísica que perde de vista a finalidade última da libido, que é o encontro de pessoas via compartilhamentos os mais variados - dentre os quais a penetração. Depois de orgulhosamente exibir aos parças o membro ereto como os canhões do desfile, tomara que cada um desses imbrocháveis evolua no sentido de descobrir, pós-infância psíquica tardia, com quantos [e quais] paus se faz uma canoa - para terminar em tom de chiste...

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